Entrevista: Manoel Marcondes Neto

Nesta entrevista, o Doutor em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes de São Paulo (USP) e autor de diversos livros de marketing cultural, Manoel Marcondes Neto explica os principais desafios enfrentados pelo marketing cultural, fornece dicas para os profissionais que desejam atuar na área e discute sobre os benefícios que as políticas públicas podem trazer para o desenvolvimento do setor no país. Confira:

Caricultura – O que despertou o seu interesse pelo marketing cultural? Como foi a sua primeira experiência na área?

Marcondes Neto- Meu interesse, como relações-públicas, já na faculdade, direcionou-se para a divulgação de artistas e espetáculos. Minha primeira experiência na área: fiz um projeto para o Departamento Cultural da UERJ, ganhei uma bolsa de estudos e fiquei um ano depois de formado trabalhando no projeto que intitulei “A UERJ abre as suas portas”, promovendo a universidade como um lugar, também, para se fluir cultura, e não só pelos seus frequentadores do dia-a-dia, mas toda a comunidade de entorno.

Caricultura- Em Minas Gerais, percebe-se a falta de investimentos em cursos e eventos para que os profissionais possam se aperfeiçoar na área de marketing cultural. Não há cursos específicos oferecidos em universidades e o governo do estado não demonstra preocupação com isso. Como o senhor avalia esses desafios enfrentados pelo marketing cultural? Na sua opinião, essa realidade se estende para o restante do país?

Marcondes Neto – Do fim para o começo: Sim, a realidade de desinteresse dos governos é geral. E nos três níveis: municipal, estadual e federal. Hoje avalio que a separação administrativa imposta (entre Cultura e Educação) está na raiz do enfraquecimento da ação cultural pública.

Caricultura – O senhor acredita que existe uma formação específica para que um profissional possa atuar na área de marketing cultural? Por quê?

Marcondes Neto –  Acredito, sim. A área de produção cultural abrange conhecimentos de Administração, Artes, Comunicação, Direito, Finanças, Marketing e… Tributos (em virtude da adoção de um único tipo de política pública de cultura – a de concessão de incentivos fiscais). Portanto, um “locus” especial verdadeiramente transdisciplinar é demanda primária para se formar perfis habilitados em articular duas coisas aparentemente inconciliáveis: o marketing e a cultura.

Caricultura – Recentemente a Câmara dos Deputados aprovou o Programa Nacional de Fomento à Cultura (Procultura) e o Vale-Cultura. Em sua opinião, essas ações poderão substituir a Lei Rouanet? Por quê?

Marcondes Neto – Tais modificações estão em gestação desde 2003… foram aprovadas apenas em primeira instância e, por isso, não entraram em vigor. A Lei Rouanet continua a vigorar quase que nos mesmos moldes de sua criação, em 1991. Ou seja, vivemos no atraso. E não acredito que as modalidades de “mecenato” nas quais agências de propaganda, artistas, patrocinadores, produtores e veículos de comunicação já estão todos viciados deixem de existir. No máximo conviverão com o vale-cultura.

Caricultura – Quais os benefícios que o senhor acredita que o Procultura e o Vale-Cultura poderão trazer para o marketing cultural brasileiro?

Marcondes Neto – As modificações em pauta querem descentralizar o investimento cultural público (Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília concentram 85% das verbas e apenas 3% dos proponentes manipulam 50% da renúncia federal) e equilibrar a decisão sobre o quê patrocinar – hoje algo a cargo dos departamentos e marketing das empresas anunciantes.

Caricultura – No seu livro “Marketing Cultural: das práticas a teoria” são apresentadas as 4 modalidades do marketing cultural: marketing cultural de fim, marketing cultural de agente, marketing cultural de meio e marketing cultural misto. Atualmente, quais desses tipos o senhor acredita que seja mais praticado no Brasil? Por quê?

Marcondes Neto – O misto, porque está baseado na escassez de recursos e na formação de parcerias, ou seja, organizações diversas em co-patrocínio. É a modalidade que mais cresce e, também, a que apresenta maior desafio de “imagem”: – como dar destaque à minha marca, se ela aparece ao lado de duas, três, cinco, dez, “n” marcas também apoiadoras da mesma iniciativa?

Caricultura – Quais as dicas para um profissional que deseja trabalhar na área de marketing cultural?

Marcondes Neto –  Procurar estudar – como autodidata ou por meio de cursos – e fazer um estágio numa produtora de arte, de vídeo, de música, de shows, de exposições, de dança etc. para conhecer o mercado e suas práticas.

Caricultura – Na sua opinião, quais os principais desafios enfrentados, atualmente, pelo marketing cultural brasileiro? Como superar esses obstáculos?

Marcondes Neto – O mais importante obstáculo é o do preconceito. Alguns puristas torcem o nariz à expressão “marketing cultural”, mas o processo de viabilizar iniciativas artístico-culturais – mesmo as públicas – é genuíno exemplo de marketing. Afinal, trata-se de conceber uma proposta de valor, precificá-la, promovê-la e distribuí-la, ou seja, a aplicação do composto de marketing (“marketing mix”) à área da produção artístico- cultural.

Sobre elianelages

Jornalista, especialista em Produção e Crítica Cultural, apaixonada por poesia, música, cinema e tudo de bom que a arte possa oferecer!
Esse post foi publicado em Entrevista e marcado , , , . Guardar link permanente.

Deixe um comentário